segunda-feira, 26 de julho de 2010

Um amor tardio e as 'putas tristes'


“No ano que completei noventa anos, quis presentear-me com uma noite de amor louco com uma adolescente virgem”. E é assim, sem rodeios, que o escritor colombiano Gabriel García Márquez nos apresenta a história do velho jornalista que escolhe o sexo para provar a si mesmo que está vivo. 'Memória de Minhas Putas Tristes', lançado em 2005 (editora Record), desfia as lembranças de vida de um solitário personagem que viveu quase um século de uma vida morna, escrevendo crônicas e resenhas maçantes para um jornal provinciano, dando aulas de gramática para alunos desinteressados e, acima de tudo, perambulando de bordel em bordel, dormindo com muitas prostitutas, até chegar, enfim, a uma inesperada história de amor.
As memórias de um escritor que se apaixona pela primeira vez aos noventa anos de idade. Presente de aniversário encomendado a uma dona de bordel, uma adolescente virgem irá despertar o amor do velho cronista do El Diário de La Paz. A paixão lhe garante sair da posição de colunista medíocre e antiquado para a de escritor da primeira página que emociona a todos os leitores que aguardam ansiosos por suas colunas dominicais.
Das lembranças do autor desfilam seus antigos casos, todas as mulheres com quem se envolveu sem paixão e suas visitas à garota que ele próprio não sabia (e nem queria saber) o nome: bastava-lhe o apelido, Delgadina, posto por ele mesmo. Aos treze anos e virgem, ela se torna uma fonte de paixão e ternura para o ancião. Com ela não mantinha relações sexuais, surge um amor casto, feito de contemplação e cuidados. Quando chegava ao bordel onde vivia a menina, se encantava em vê-la dormir e sonhar e pela manhã deixava dinheiro para que a cafetina cuidasse bem de sua amada.
Um assassinato no quintal do bordel numa madrugada separa os dois amantes. Ele não pode voltar, ela teve que sumir. O desencontro provoca todos os variados sentimentos doentios que o amor distante pode trazer. Ciúmes, preocupação, aflição, dor de adolescente. Durante um ano sente toda a intensidade da vida lhe atravessar e pode por fim esperar pela morte satisfeito de amar alguém.
Trechos de “Memória de minhas putas tristes” de Gabriel García Márquez.

"No ano de meus noventa anos quis me dar de presente uma noite de amor louco com uma adolescente virgem. Lembrei de Rosa Cabarcas, a dona de uma casa clandestina que costumava avisar aos bons clientes quando tinha alguma novidade disponível. Nunca sucumbi a essa nem a nenhuma de suas muitas tentações obscenas, mas ela não acreditava na pureza dos meus princípios. Também a moral é uma questão de tempo, dizia com sorriso maligno, você vai ver."

"Os linotipistas desacertaram com uma cafeteira elétrica igual às três de meus aniversários anteriores. Os tipógrafos me deram de presente uma autorização para apanhar um gato angorá no depósito municipal. A gerência me deu uma bonificação simbólica. As secretárias me deram três cuecas de seda com marcas de beijos estampados e um cartãozinho em que se ofereciam para apagá-los. Na hora, pensei que um dos encantos da velhice são as provocações que as amigas jovens se permitem, achando que a gente está fora do jogo."

"Graças a ela enfrentei pela primeira vez meu ser natural enquanto transcorriam meus noventa anos. Descobri que minha obsessão por cada coisa em seu lugar, cada assunto em seu tempo, cada palavra em seu estilo, não era o prêmio merecido de uma mente em ordem, mas, pelo contrário, todo um sistema de simulação inventado por mim para ocultar a desordem da minha natureza. Descobri, enfim, que o amor não é um estado de alma e sim um signo no zodíaco."

"Atropelei : O sexo é o consolo que a gente tem quando o amor não nos alcança."

Fonte:  Adaptado do site http://boaleitura.multiply.com/

Nenhum comentário:

Postar um comentário