terça-feira, 4 de maio de 2010

A verdadeira primeira dama de Natal



Tadeu de Oliveira

Natal, na década de 40, quando o Trampolim da Vitória concretizava-se como ponto crucial da estratégia 'yankee' na Segunda Guerra Mundial, escondia pérolas históricas em sua sociedade, algumas relembradas com orgulho até os dias de hoje, outras jogadas no buraco-negro do esquecimento. A senhora Maria de Oliveira Barros, paraibana de Campina Grande, é uma delas e uma das mais reluzentes.

Maria Boa, como era conhecida popularmente, era dona do maior e melhor cabaré que o Rio Grande do Norte já teve. Um mito que não sobreviveria não fosse a perspicácia de professores e alunos universitários, que resgatam sua vida em trabalhos acadêmicos de variados estilos. É o caso do texto 'Maria Boa, a primeira dama', do jornalista José Correia Gomes Neto. Ou de um capítulo do livro "Histórias que vivi", de Ary Guerra Cunha Lima.

Ambos resgatam fatos que comprovam a importância de Maria Boa e seu estabelecimento para a estadia norte-americana em Natal. De tão famoso, o cabaré era referência geográfica da cidade. Sua clientela variava de políticos de extrema importância a americanos oriundos da base de Parnamirim Field. A cafetina chegou ao ponto de ser homenageada pelos 'sobrinhos do Tio Sam' em um avião modelo B-25 utilizado no front. Quem custou a acreditar neste fato foi a própria Maria. Até que alguns tenentes decidiram levá-la até a linha de estacionamento dos B-25 logo após o jantar para não despertar a atenção dos curiosos. Ela constatou o fato. As lágrimas verteram de seus olhos quando viu à sua frente, pintada ao lado do número 5079, a inscrição "Maria Boa".

A importância da figura de Maria para a sociedade da época ainda é confirmada em outros trechos do texto na voz de outros autores citados por Correia. Eliade Pimentel, no artigo 'E o carnaval ficou na memória' destaca a presença de Maria Barros nos carnavais de Natal: Lá pela década de 1950, os desfiles passaram a acontecer na Avenida Deodoro da Fonseca. Maria Boa desfilava com Antônio Farache em carros conversíveis.

Em 2003 o cantor Valdick Soriano, quando entrevistado por Everaldo Lopes, registrou que quando esteve em Natal pela primeira vez, cantou até para as meninas de "Maria Boa". Todas essas vozes confirmam que Maria Boa era e sempre será a primeira dama de Natal, às avessas, quem sabe, mas com toda a representação social de uma verdadeira lady.

Para a Natal provinciana dos anos 40 e 50, diante de uma sociedade extremamente puritana, ela afirmou-se como profissional do sexo bem-sucedida e fez morada (ainda faz) na mente de homens e mulheres que conhecem algum detalhe pitoresco sobre a história da paraibana. Uma mulher de personalidade forte o bastante para marcar seu nome na história. E, apesar da fama, Maria Barros concedeu, em vida, apenas uma entrevista que não pôde ser gravada. Serviria à produção do filme For All – Trampolim da Vitória, que retrata a Natal de 1943, quando havia 15 mil soldados americanos na base de Parnamirim, sem esquecer de mencionar Maria Boa e seu festejado cabaré.

Nos anos 1980, relata Ary Cunha Lima, com a proliferação das boates, o cabaré entrou em declínio e fechou. Quanto à proprietária, Maria morreu em Natal em 1997, aos 77 anos. Já no novo século, a prostituição permanece em uma espécie de limbo social, e assim o mito Maria Boa terminou alijado do contexto social da Segunda Guerra Mundial na cidade do Natal. Mas a fama dela, por si só, comprova que não existe sociedade sem sexualidade. Que me perdoem os puritanos, mas ela é fundamental.

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